Aposentadoria do Malandro
Aposentadoria do Malandro: Já está familiarizado com as regras da aposentadoria no Brasil? Já fez sua previdência privada? Ou está preparado para a vida de rockstar? Assim você pode fingir que aposenta, enquanto continua trabalhando — fazendo shows — e ganhando muito dinheiro. Antes mesmo do Slayer fazer seu último show (saiba mais sobre a despedida deles clicando aqui), fomos “surpreendidos” pela notícia da volta do Mötley Crüe – apenas o mais recente caso numa looonga lista de bandas que flertaram com o merecido descanso, mas chegaram à conclusão que fazer turnês em voos de primeira classe e se hospedar nos melhores hotéis (enquanto todos fazem suas vontades) ainda é mais vantajoso. Confira algumas delas:
Ozzy Osbourne é um que gostou de fazer turnês de despedida. Se contarmos a primeira vez que ele disse isso, mais duas vezes com o Black Sabbath, o velho madman já vai acumular a quarta aposentadoria. Isso mesmo, a quarta. A primeira foi em 1992, convenientemente chamada de ‘No More Tours’, no rastro da turnê do álbum ‘No More Tears’. Diagnosticado com esclerose múltipla, Ozzy programou 64 shows, com os dois últimos contando com a participação especial da formação clássica do Sabbath.
Três anos depois, Ozzy descobriu que o diagnóstico estava errado (o que ele tinha é uma síndrome semelhante ao mal de parkinson, na verdade). Cansado da vida de dono-de-casa-suburbano, ele embarcou na ‘Retirement Sucks Tour’, lançando um novo álbum e seu próprio festival, o Ozzfest.
Em 1998, após uma turnê com a formação original do Sabbath, foi lançado o CD ‘Reunion’ e, no ano seguinte, o vídeo ‘The Last Supper’ — que seria o último suspiro da banda. Mas, se Ozzy pode continuar solo, por que o Black Sabbath ia continuar sem ele?
Como Ozzy sempre quis encerrar (*cof, cof*) sua carreira com um disco do Sabbath, a formação quase original — Bill Ward não foi chamado por motivos de saúde (*COFgranaCOFCOFCOF*) — lançou o disco ‘13’ e caiu na estrada entre 2012 e 2014. Com uma pausa em 2015, agendaram a ‘The End Tour’, com 81 shows, encerrando a carreira dos pioneiros do metal em sua cidade natal, Birmingham.
Mas claro que aposentadoria pouca é bobagem e o velho madman está prestes a lançar um novo disco. Vamos aguardar pra ver quem para primeiro, Ozzy ou Keith Richards.
Outro gigante do metal que anunciou a aposentadoria do mallandro foi o Judas Priest, em 2011. A ‘Epitaph Tour’ ficou marcada, principalmente, por três motivos. Primeiro, por cobrir pelo menos uma música de cada disco da carreira da banda.
Segundo, por marcar a saída do guitarrista fundador da banda, K.K. Downing, por motivos que jamais ficaram muito claros (*COFgranaCOFCOFCOF*), sendo substituído por Ritchie Faulkner.
E terceiro porque teve gente que acreditou que era despedida deles mesmo. Depois de dois anos vendendo ingressos como “pode ser a última vez”, o Judas Priest voltou para o estúdio e gravou o álbum ‘Redeemer of Souls’, partindo pra outra turnê logo em seguida. A explicação oficial da banda foi um “não era bem isso que a gente quis dizer”.
De desculpas esfarrapadas o metal está cheio e nenhuma melhor que o Scorpions. O canto do cisne começou em 2010, quando a banda anunciou que o álbum ‘Sting in the Tail’ seria o último, e ainda não acabou. Viajaram pelo mundo inteiro entre 2010 e 2012, incluindo o Brasil (duas vezes) e continuam gravando e excursionando até hoje. Ou a demanda por shows é maior do que a gente pensa, ou…
“Fomos influenciados pelo empresário que estava com a gente na época”, explica o guitarrista Matthias Jabs. O empresário não foi identificado para responder nossas perguntas. Segue o jogo.
Quem também anunciou o FIM e depois mandou um “olha, vou explicar melhor” foi o Kiss. O quarteto se reuniu com a formação original no final dos anos 90 e, após a turnê do álbum ‘Psycho Circus’, achou por bem encerrar em grande estilo.
A ‘Farewell Tour’ percorreu os Estados Unidos no ano 2000, muito bem sucedida. Então venderam mais alguns ingressos em 2001, por que não? Mas olha, já que a gente está aqui, vamos continuar excursionando em 2002? E segue nessa toada – com um anúncio que, agora, parece definitivo. Os integrantes originais começam a admitir que já deu, né? “Nós somos a banda que mais trabalha duro no show business, eu visto mais de 18 quilos com pregos, armadura e salto de plataforma de sete polegadas. Cuspo fogo, voo pelo ar e coisas assim. Se Bono ou Jagger, que todos nós amamos, tivessem que fazer o que eu faço, eles não durariam uma hora”, declarou Gene Simmons recentemente. “Então, nós não seremos capazes de fazer isso até os nossos 70 anos, e eu já estou com 67”, concluiu o humildão.
Trent Reznor, do Nine Inch Nails, chegou a alfinetar Simmons, dizendo que não queria acabar como ele, “um homem velho que se veste de palhaço para divertir crianças” e anunciou, em 2009, a ‘Wave Goodbye Tour’. Mas ou você se aposenta como herói ou vive o bastante para se tornar… Gene Simmons.
A turnê de despedida acabou em setembro de 2009, mas o Nine Inch Nails retomou as atividades em 2013 e segue divertindo crianças até a presente data. 🙂
Os piratas do Running Wild também anunciaram a aposentadoria, em 2009. Com um show de despedida no Wacken Open Air, o descanso durou três anos. Em 2012, o grupo lançou mais um disco, embarcou em mais um turnê e… A mesma história.
Até mesmo Paul DiAnno, o eterno ex-vocalista do Iron Maiden, enganou não apenas a previdência em seu país (DiAnno chegou a ser preso por se declarar incapaz de trabalhar para receber uma espécie de seguro-saúde, enquanto fazia turnês pelo mundo), mas o mundo do metal, ao anunciar, em 2012, que se aposentaria.
Mas, em 2014, ele reuniu a banda Architects of Chaoz para lançar um novo álbum e, apesar de sérios problemas de saúde, ele continua fazendo shows esporadicamente. Este ano ele subiu ao palco com a banda-tributo The Iron Maidens, numa cadeira de rodas. Mesmo debilitado, não falta vontade a este simpático punk inglês.
Um clássico, os gigantes do The Who não poderiam ter uma carreira marcada por todos os excessos típicos do rock n’ roll sem uma aposentadoria do mallandro também. Em 1982, divulgando o álbum ‘It’s Hard’, excursionaram pela América do Norte até dezembro.
A aposentadoria terminou com uma reunião em 1985, uma reuniãozinha só, nada demais. E mais uma em 1988. Mas foi só essa. Daí outra em 1989, mas pacabá. Diferente das outras, a reunião de 1990 seria a final (se não fosse aquela outra em 1991). E em 1994 se reniram mais uma vez porque cê sabe, neah.
Foi só em 1996 que pararam de enganar a imprensa, os fãs e a si mesmos, voltando em definitivo, real oficial. Até quando? Não sabemos. Voltam depois? Com certeza.
O grande prêmio vai para David Coverdale e suas idas e vindas com o Whitesnake. Em 1990, após o último show da turnê do multi-platinado ‘Slip of the Tongue’, Coverdale declarou estar cansado dos negócios, da burocracia, dos rigores da turnê, dos problemas que levaram ao divórcio de sua (então) esposa e resolveu “tirar um tempo para refletir”.
Ele voltaria acompanhado do guitarrista Jimmy Page, num projeto sensacional, mas que teve vida curta. O Coverdale/Page, apesar do nome nada criativo, lhe deu ânimo para retomar a carreira com o Whitesnake, lançando uma coletânea e saindo em turnê — ao final da qual, ele considerou se aposentar.
Para a surpresa de ninguém, ele voltou em 1997 com o álbum ‘Restless Heart’ e uma turnê, que deveria ser a última. Adivinha o que aconteceu?
A partir de 2000, ele se dividiu entre uma carreira solo (que era igual o Whitesnake) e sua velha banda (que era a cara de sua carreira solo) até o lançamento do álbum de regravações do Deep Purple, ‘The Purple Album’. Este deveria ser o fim de sua carreira, terminar como começou, um retorno às origens, etc.
“Bem, é interessante, pois quando eu mixava o disco, me veio à cabeça… sabe, estava com 63 anos de idade, e pensei ‘quanto tempo vou ter que continuar fazendo isto?’ Seria o encerramento perfeito de minha carreira — terminar onde comecei. Mas acabou fazendo efeito contrário… O que posso dizer é que me sinto revitalizado. Então as ideias que eu tinha seis meses atrás… eu estava sendo honesto quando concedi as entrevistas, era o que eu achava na época. Mas tive momentos fantásticos na turnê pelos EUA com a banda, foi incrível”.
Vamos concordar que deve ser muito difícil para alguém que trabalha com a criatividade e lida tanto com emoções simplesmente parar. A criatividade não se esgota (ainda que possa dar lá uma definhada) e passar os dias cuidando da casa deve ser uma tortura para quem se habituou com os gritos das multidões e a força de sua música. O ex-jogador, talvez treinador e quem sabe comentarista Paulo Roberto Falcão uma vez declarou que o jogador de futebol morre duas vezes: a primeira é quando se aposenta. O mesmo deve ser verdade para tantos ícones do rock e metal que ainda se esforçam para se manter na estrada, mesmo pensando em desistir algumas vezes.
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