Os 30 anos de Painkiller do Judas Priest
A história até aqui…
Os 30 anos de Painkiller do Judas Priest: O Judas Priest é celebrado como um dos fundadores do Heavy Metal – um termo que, por si só, carrega suas polêmicas. Apesar do senso comum ditar que o estilo começa com o primeiro disco do Black Sabbath, em 1970 (sobre o qual falamos aqui) os próprios renegam o rótulo. No começo dos anos 80, a Europa viu a ascenção da NWOBHM, em que diversas bandas começaram a se destacar, mais notoriamente Iron Maiden, Saxon e Def Leppard. Esse último conseguiu grande sucesso nos Estados Unidos, com um som mais voltado para as rádios.
Esse “heavy metal de rádio”, que nada mais é que o bom e velho hard rock, encontrou reflexo em bandas como Mötley Crüe, W.A.S.P., Bon Jovi, Cinderella, L.A. Guns e Poison, a “próxima geração” do som que já era feito por Aerosmith, Kiss, Foreigner e Rose Tattoo. O Judas Priest soube como colocar seus pés em território americano, com o mesmo “heavy metal de rádio” e um visual mais glam, como fica bem latente em álbuns como “Turbo”, “Defenders of the Faith” e “Screaming for Vengeance”.
A década de 80 é marcada por esse som e por esse visual mas, paralelo a tudo isso, um estilo vai ganhando força no underground e conquistando espaço em shows, festivais, prateleiras de lojas e até na mídia especializada: o thrash metal. A virada da década é dominada por álbuns como “…And Justice For All” (Metallica), “Alice in Hell” (Annihilator), “Practice What You Preach” (Testament), “Seasons in the Abyss” (Slayer) e “Rust in Peace” (Megadeth).
Fusão
Desde o álbum “Ram It Down”, o Priest vinha se afastando do heavy/hard para voltar a flertar com um som mais tradicional. Parecia natural que o álbum seguinte fosse ainda mais pesado e, com a saída de Dave Holland, o Priest precisava de um novo baterista. Entra em cena o americano Scott Travis, da banda de speed metal Racer X, que trouxe consigo o pedal duplo e o “blast beat” – e, consequentemente, algumas mudanças para o som do Judas Priest, aproximando-os do thrash metal.
Produzido por Chris Tsangarides, “Painkiller” não pôde ser lançado até o fim dos julgamentos de responsabilidade sobre a tentativa de suicídio de dois jovens fãs, um sendo bem-sucedido, com a banda sendo acusada de colocar mensagens subliminares em sua música (mais especificamente, na faixa “Better By You, Better Than Me”, do álbum “Stained Class”). A banda foi inocentada em agosto e o disco chegou às lojas em 3 de setembro de 1990.
A recepção não poderia ter sido melhor. Aclamado como o melhor disco do Priest desde “British Steel” (e talvez até de sua história), “Painkiller” é cheio de riffs memoráveis, canções marcantes, temas épicos e músicas que se tornaram emblemáticas. A faixa de abertura é, possivelmente, um dos grandes cartões de visita da história do metal, com o vocalista Rob Halford em ótima forma e os guitarristas K.K. Downing e Glen Tipton destilando riffs e solos como nunca fizeram antes.
Tudo isso dentro de um clima coeso, com uma produção bastante técnica e que privilegia a agressividade da banda – então, uma veterana com mais de vinte anos de estrada. A energia bruta de “Painkiller” os colocava em pé de igualdade com jovens bandas de thrash metal e até mesmo death metal, conquistando novos níveis de respeito e reconquistando a reputação de pioneiros do estilo, capazes de modernizar o seu som sem perder as características básicas.
O Rebelde
Como polêmica pouca é bobagem, o final da turnê de “Painkiller” (que passou pelo Brasil, no festival Rock in Rio II) marcou a saída de Halford da banda. Disposto a explorar novas possibilidades com a música, principalmente pelas influências que era capaz de incorporar no seu som, ele criou o Fight, trazendo jovens músicos de thrash e death metal, mas se afastando cada vez mais do que fazia antes. O Priest, por sua vez, levou alguns anos para se recuperar e recrutar um substituto: Tim “the Ripper” Owens. A música do Priest seguiu de onde parou, fortemente influenciada por estilos mais extremos do que o simples heavy metal. Eventualmente, Halford voltou a fazer o que sabe melhor, reconciliando-se com o Priest e voltando a compôr, gravar e excursionar com os antigos companheiros.
A banda segue na ativa até hoje, com um som que vem diretamente de “Painkiller”. Seu disco mais recente, “Firepower”, de 2018, é um bom exemplo de como esses pioneiros veteranos realmente encontraram seu caminho a partir de “Painkiller”, um disco que serviu de divisor de águas, para o bem e para o mal. Mais do que isso, é um dos maiores legados da música pesada de todos os tempos, com sua vitalidade, energia e som atemporal.
Faixa a Faixa
A abertura com a faixa-título é como um tanque de guerra passando por cima de palhoças e barracos. A introdução de bateria é um excelente tiro de aviso para a profusão de riffs hiper velozes e, principalmente, para as notas altíssimas que Halford alcança. Seus seis minutos são uma batalha que parece que nunca vai terminar, contando a história de um anjo de metal que vem à Terra para vingar a humanidade. Em seguida temos “Hell Patrol”, que poderia ser uma boa oportunidade para respirarmos, mas ela não dá descanso. Num tom mais baixo e velocidade mais cadenciada, ela só parece calma, com sua letra que fala dos pilotos americanos que lutaram na primeira guerra do Golfo Pérsico. Quando “All Guns Blazing” começa, fica bem claro que não teremos descanso. Notas altas, velocidade e muito peso, como manda essa nova encarnação do Priest.
“Leather Rebel” é outro massacre, uma motosserra sendo utilizada para dilacerar incautos. Ela lembra bastante músicas de álbuns mais recentes do Priest. Na sequência, “Metal Meltdown” aposta em variações de riffs, ritmos e tempos, explodindo na sua cara a mil notas por segundo. Temos então outro dos grandes épicos deste disco (repare como é difícil se destacar aqui): “Night Crawler”. A introdução cheia de clima (com direito a teclados do lendário Don Airey) e o dedilhado, que lembra aquelas instrumentais aterrorizantes do King Diamond, abrem caminho pra mais o quê?
Isso mesmo, popbanger: porrada, porrada e porrada. Nunca de maneira indiscriminada ou gratuita, mas precisa. No momento certo. Música de excelente qualidade sendo tocada a velocidades alucinantes por homens que se tornaram ícones.
“Between the Hammer and the Anvil” é uma das mais “apagadas” em um disco com tantos momentos espetaculares. Mas tem todas as qualidades e características que tornam essa fase grandiosa. É difícil competir com tantos clássicos, mas ela não perde feio, pelo contrário. Mas aí chegamos a outro ponto algo: “A Touch of Evil”, uma balada cheia de maldade e peso, na melhor tradição do Priest, colocando-a lado a lado com a lendária “Beyond the Realms of Death”. A curta vinheta instrumental “Battle Hymn” prepara o caminho para o encerramento grandioso com “One Shot at Glory”, tão longa quanto a faixa que abre o álbum, tão épica quanto.
O Veredicto
A longevidade desse álbum pode ser facilmente atestada ao conferirmos os set-lists das turnês posteriores do Priest, ou mesmo sua popularidade entre os fãs. Não há nada aqui que seja forçado, exagerado ou despropositado – a banda realmente conseguiu incorporar novos elementos ao seu som e se tornar algo maior, mais poderoso. Qualquer amador ia soar como um poser se tentasse uma mudança dessas (o Pantera é um bom exemplo disso), mas aqui vemos uma banda lendária fazendo história – não pela primeira vez.
É assim que se reconhecem os grandes. É assim que o Priest continua na ativa.
Enquanto a humanidade se lançava para sempre no abismo sem fim do caos eterno, os restos da civilização gritavam por salvação. A redenção rugiu no céu ardente… o Painkiller!”
Painkiller
Columbia Records
Produzido por Chris Tsangarides
Rob Halford – vocal
Glenn Tipton – guitarra
K. K. Downing – guitarra
Ian Hill – baixo
Scott Travis – bateria
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